Querida princesa,

fiquei sabendo que você foi apedrejada covardemente, no domingo, por se vestir de branco e mostrar pro mundo inteiro o reflexo da paz branca e morna da fé que aquece seu coração desde quando você nasceu. Da força que você carrega aí dentro desse peito.

E, na verdade, eu tenho vergonha em escrever a palavra "apedrejar" porque é absurdo pensar que seres humanos ainda fazem isso uns com os outros pelo simples fato de não compreenderem e não aceitarem as diferenças de cada um, por não olharem com respeito para a imensidão que o outro guarda dentro de si. Sim, há muitas coisas ruins nesse espaço interno também, mas pessoas honestas e corajosas lutam todos os segundos da vida para que somente as coisas boas sobrevivam. E, infelizmente, não foi o bem que sobreviveu quando eu vi hoje cedo a imagem da sua cabeça ensanguentada. Na verdade, nada sobreviveu naquele instante, apenas morreu. Morreu um pedação da minha fé na humanidade (que eu tento resgatar todos os dias). E a vida voltou a ficar escura e triste.

Pode ter certeza de que quando você levou essa pedrada, eu fui apedrejada também, e senti a sua dor. E sei que várias pessoas que são julgadas, desrespeitadas, humilhadas, caluniadas e difamadas todos os dias por suas diferenças não aceitas por uma parcela ignorante da sociedade sentiram a dor dessa pedrada também. Portanto, a sua dor se tornou a minha também. A sua dor se tornou coletiva. 

Voltando ao apedrejamento (como dói repetir isso), durante toda a minha vida eu ouvi a história da frase que Jesus disse sobre atirar a primeira pedra aquele que nunca pecou. E, em nome Dele, do amado Cristo, pecadores em massa andam com os bolsos cheios de pedras para arremessarem à primeira pessoa que foge daquilo que é considerado mais certo ou mais próximo do "padrão". Em nome Dele eu tenho visto pedras serem arremessadas todos os dias em várias vidas inocentes. Em nome Dele eu tenho visto um ódio  e uma intolerância tremendos sendo espalhados pra todo o lado. Em nome Dele você recebeu uma pedrada. Em nome Dele eu já fui apedrejada várias vezes por seguir as crenças que mais fazem meu coração sorrir (mas eu sei que a sua dor foi muito maior que a minha, de verdade). Em nome Dele pais colocam filhos pra fora de casa, em nome Dele pessoas são espancadas e condenadas diariamente. Em nome Dele inúmeras injustiças acontecem todos os dias. E eu sempre me pergunto o quão triste Ele deve estar com tudo isso. Às vezes eu acho que ele sangra também novamente ao ver essas coisas, ao ver o nome Dele sendo pronunciado em vão e usado para fazer o mal. E eu sei, pelo Cristo que eu aprendi a amar, que Ele sangrou  e chorou também com você no domingo.

Hoje eu li também que você pretende parar de usar as suas roupas brancas tão bonitas. E eu fiquei triste. Fiquei triste porque mesmo sem saber quase nada sobre a sua religião, eu aprendi a respeitá-la de um modo muito especial. E tenho me informado cada vez mais para não reproduzir nenhuma besteira ou informação errada. Mas principalmente para não me intoxicar mais com tantas coisas horríveis que falam da sua religião, e que eu sei que é puro fruto de muita ignorância. Portanto, não dá pra ter ódio dessas pessoas, a gente tem que ter compaixão por elas, porque ainda não aprenderam que a cada nova atitude horrenda mais elas se afastam do Cristo que dizem amar.

Olha, eu não gostaria que você deixasse de usar branco. E não precisa ter medo de morrer, porque o amor e a força da fé que você acredita te salvou e tornou essa pedrada minúscula perto do tamanho de luz que há dentro de você da vida que ainda está por vir. Sei, sim, que você está apavorada. Eu também fico todos os dias. Dá um medão mesmo de tudo, mas a gente pode pegar essas pedronas gigantes que nos arremessam todos os dias e ficarmos fortes. A gente pode construir um tanto de castelos bonitos e sólidos, e mostrar, e ensinar pra todo mundo o quanto a força do bem é bonita. E que vale muito a pena ser filhos da luz.

Espero que você possa curar rapidinho essas feridas e esse coraçãozinho cheio de vida e voltar a sorrir sem medo. E vestir todo o branco que você quiser, mostrando sempre ao mundo inteiro que também vale a pena ser filha purinha da paz.